Perestroika e glasnost
Perestroika e glasnost foram políticas implementadas na União Soviética para reformar o Estado. Seus efeitos, entretanto, foram responsáveis pela ruína da URSS.
Por Cassio Remus de Paula

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Perestroika e glasnost foram políticas implementadas no governo soviético ao final da década de 1980, com fins de reformar, respectivamente, as liberdades econômica e cívica da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Promulgadas pelo chefe de Estado Mikhail Gorbatchev, a Perestroika procurava adaptar o mercado soviético às influências externas, permitindo pequenos reajustes neoliberalistas, enquanto a Glasnost objetivava oferecer maior transparência política e democrática aos cidadãos da União Soviética.
No entanto, ambas as políticas acabaram por trazer consequências negativas à potência, resultando em sua dissolução no ano de 1991 e, com isso, no término da Guerra Fria.
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Resumo sobre perestroika e glasnost
- Perestroika e glasnost foram duas políticas de reformas implementadas pela União Soviética no contexto dos anos finais da Guerra Fria.
- A perestroika foi uma série de reformas econômicas neoliberais colocada em vigor no ano de 1986 e que permitiu a abertura de pequenos negócios e o corte de subsídios desnecessários.
- A glasnost objetivava abertura política, midiática e cívica, a fim de se conquistar maior aprovação popular do regime socialista gerido pela União Soviética.
- Desde a década de 1960, a União Soviética enfrentava uma crise econômica decorrente de sua estagnação industrial e a baixa eficiência da burocracia diante das demandas reais do mercado.
- Ao mesmo tempo, muitas famílias da época do regime de Joseph Stalin demandavam explicações relacionadas aos crimes contra a humanidade exercidos no decorrer de seu governo totalitário.
- A fim de retomar a posição de potência global no contexto da Guerra Fria, o chefe de Estado Mikhail Gorbatchev aprovou a perestroika e a glasnost.
- Ambas as políticas de reformas causaram efeito contrário: a perestroika, por causar uma queda abrupta no PIB, e a glasnost, por gerar uma imagem negativa da União Soviética.
- Apesar de procurarem reascender o Estado diante das ameaças capitalistas, as políticas consideradas modernizantes levaram a União Soviética a uma crise irreparável, facilitando a entrada de líderes liberais, como Boris Iéltsin, que promoveu a dissolução da república em 1991.
Videoaula sobre perestroika e glasnost
O que foram a perestroika e a glasnost?
Perestroika e glasnost, respectivamente, foram os nomes dados às políticas de reformas econômicas e cívicas da União Soviética no contexto dos anos finais da Guerra Fria. Sob o pretexto de modernização do Estado, essas medidas, outorgadas pelo líder soviético Mikhail Gorbatchev, significaram a dissolução da URSS no início da década de 1990.
A perestroika, assinada no ano de 1986, tinha como objetivo reformar a economia soviética por meio de medidas de aproximação com políticas neoliberais, enquanto a glasnost propunha meios de diminuir a censura e oferecer abertura política, cívica e midiática.
Antecedentes históricos da perestroika e da glasnost
De 1947 a 1991, a Guerra Fria havia polarizado o mundo em duas vertentes ideológicas: a socialista, difundida pela União Soviética e seus aliados do Pacto de Varsóvia, e a capitalista, disseminada pelos Estados Unidos e os países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Apesar de não haver conflitos de grandes proporções entre as potências beligerantes, como nas Guerras Mundiais, o conflito significou um intenso atrito de dissuasão nuclear.
Desde o final da década de 1960, a popularidade da URSS passou a decair, tanto externa quanto internamente. No âmbito financeiro, o Estado soviético se estagnou em decorrência da ausência de políticas modernizantes do setor industrial (no contexto, por exemplo, estabeleciam-se metas de produção sem a análise real das demandas, o que levava, também, à falta de incentivos na inovação tecnológica por parte do governo).
Em 1968, a Tchecoslováquia foi invadida pelas tropas soviéticas, que sufocaram uma tentativa de se aplicar reformas políticas no país (evento que foi amplamente televisionado e divulgado pela mídia ocidental como a Primavera de Praga). Grande parte dos recursos econômicos e militares soviéticos foi gasta na Guerra do Afeganistão (1979-1989) contra a influência norte-americana.
A desaprovação popular à União Soviética, proveniente dessas e outras crises, levou o líder de Estado Mikhail Gorbatchev, em exercício no poder desde 1985, a propor reformas econômicas e cívicas.
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Objetivos da perestroika e da glasnost
Os objetivos de Gorbatchev, por meio da perestroika e glasnost, visavam não apenas modernizar a URSS, mas se aproximar ideologicamente da potência rival. Observe abaixo os desígnios estipulados por essas políticas.
→ Objetivos da perestroika
Objetivava a modernização da economia soviética. Entre elas, propunha-se:
- diminuir o poder da burocracia de Estado, como o Gosplan, que fiscalizava a oferta e demanda das empresas;
- atrair o mercado estrangeiro para promover novas tecnologias e a aplicação de capitais internacionais;
- o corte de subsídios a indústrias ineficientes e a substituição da priorização do investimento de indústria pesada (quase exclusivamente para fins bélicos) pela produção de bens de consumo;
- maior flexibilidade econômica para os Estados satélites e clientes sem a interferência direta do governo;
- permissão para a abertura de pequenos negócios privados, entre outros.
→ Objetivos da glasnost
Objetivava uma reforma política de promoção à liberdade de imprensa e acesso a informações do regime, a fim de aumentar a liberdade cívica e, em menor grau, econômica do país. Mais especificamente, a glasnost tornou possível:
- críticas ao regime soviético por parte da mídia;
- investigações à corrupção praticada no partido e no Estado;
- maior flexibilidade eleitoral (com a participação de candidatos não comunistas); e
- o reconhecimento dos crimes perpetrados durante o regime totalitarista, principalmente os causados durante o governo de Josef Stalin.
Apesar de procurar angariar maior aprovação para o socialismo soviético, a glasnost causou efeito contrário, já que a transparência às informações demonstrou os vários problemas políticos e econômicos do Estado.
Criação da perestroika e glasnost
Ao final da década de 1960, a União Soviética estava enfrentando uma crise econômica em decorrência de baixa produtividade, que se contrapunha aos gastos exacerbantes direcionados à Corrida Armamentista e, a partir do final dos anos 1970, à Guerra do Afeganistão. Entre 1964 e 1982, o país se encontrava sob o governo de Leonid Brejnev, sucedido por outros dois líderes que exerceram a gestão de Estado por pouco tempo (em decorrência de suas idades avançadas).
A insatisfação popular e a falta de políticas econômicas modernizadoras colocavam a posição da URSS em risco perante os Estados Unidos. A fim de reverter a situação, o então novo líder soviético, Mikhail Gorbatchev, em exercício de poder desde 1985, decidiu reformar tanto a economia quanto a sociedade do Estado por meio das, respectivamente, perestroika e glasnost.

Gorbatchev fazia parte de uma ala reformista do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) que procurava permitir maior flexibilidade econômica, além de enfatizar a produção de bens de consumo e reduzir os gastos com as indústrias de base e investimentos bélicos. Suas primeiras aprovações vinculadas à perestroika consistiram em conceder maior autonomia financeira às indústrias (sem a regulação direta do Estado) e a permissão de se abrir empresas privadas, desde que submetidas a altos tributos e regras de funcionamento.
Quanto à glasnost, Gorbatchev defendia que uma política de transparência e debate devolveria a popularidade e a eficiência da União Soviética. Suas medidas iniciais consistiram em conceder maior liberdade de imprensa (a qual imediatamente passou a criticar o regime soviético), a aprovação de vagas no Congresso dos Deputados do Povo e uma tentativa de reconciliar o Estado com as famílias atingidas pelo regime totalitário de Stalin.
As medidas aprovadas por Gorbatchev enfrentaram resistência dentro do Partido Comunista, cujos opositores perceberam possíveis efeitos reversos, como o aumento da desaprovação popular em relação ao Estado e uma ruptura irreversível com os fundamentos econômicos que sustentavam a União Soviética.
Perestroika e glasnost deram certo?
Pode-se afirmar que as políticas de perestroika e glasnost não deram certo. Os receios da oposição às reformas de Gorbatchev não foram infundados, já que tanto a perestroika quanto a Glasnost geraram efeito contrário: em vez de modernizar a economia do Estado, a perestroika gerou uma crise ainda mais severa, e, no lugar de aumentar a popularidade da URSS, a glasnost causou ainda maior desaprovação nacional e internacional, devido à exposição dos problemas internos do país.
Consequências da perestroika e da glasnost
Com a implementação da perestroika, o combate contra a crise alimentícia não foi refreado; muito pelo contrário, o colapso se agravou com ainda mais intensidade. O motivo se dava pela inexistência de um mercado totalmente livre para essa indústria, que, apesar de possibilitar a venda de excedentes de produção, era ainda regulada pelo governo. Com a Lei das Cooperativas de 1988, os pequenos negócios privados do setor passaram a funcionar por meio de excessivos tributos e restrições que dificultaram ainda mais a distribuição de alimentos.
A permanência da fiscalização de Estado incentivou muitos agricultores a venderem os seus produtos sem a supervisão do governo (ou seja, de maneira ilegal, a fim de estipular seus próprios preços), o que acarretou numa diminuição das ofertas de bens oferecidos legitimamente. Fazendas entraram em falência, a inflação e o desemprego aumentaram, os preços e o racionamento de alimentos agravaram a fome, e o crime organizado (máfia russa) se fortaleceu com o contrabando de produtos agrícolas desviados por diversos produtores. Estima-se que, entre o final da década de 1980 e início dos anos 1990, o PIB soviético tenha diminuído cerca de 20%.
As consequências não se mantiveram apenas no âmbito econômico, já que a Glasnost acabou por demonstrar as diversas falhas na estrutura do Estado soviético desde a liderança de Stalin. Questões como o Grande Expurgo (1936-1938) e a edificação dos Gulags, daquele período, incitaram dúvidas em parte da população soviética e críticas dos países considerados democráticos, principalmente no Ocidente.

Além disso, a liberdade de expressão midiática intensificou a reprovação popular relacionada ao governo, devido aos diversos artigos ligados às denúncias de corrupção do regime. Como resultado, diversos Estados soviéticos demandaram independência, como a Ucrânia, a Letônia, a Estônia e a Lituânia.
Mas a crise também afetou a política interna, dividindo as opiniões dos membros do Partido entre conservadores (contra as reformas) e nacionalistas reformistas (que demandavam mudanças ainda mais radicais e até mesmo a independência da Rússia); entretanto, ambos os grupos passaram a reprovar a política de Gorbatchev.
Devido às diversas crises causadas pela Perestroika e Glasnost, em 1991, Mikhail Gorbatchev e Boris Iéltsin (que se tornaria o primeiro presidente da Rússia) acordaram em dissolver a União Soviética após uma tentativa de golpe de Estado por parte da ala conservadora do Partido. Com isso, consequentemente, a Guerra Fria também chegava ao fim.
Saiba mais: Queda do Muro de Berlim — outro capítulo do fim da Guerra Fria
Exercícios resolvidos sobre perestroika e glasnost
1. (UCS-RS) Em 1991, ocorreu um dos mais significativos fatos da história recente: a extinção da União Soviética. Sobre esse fato histórico, é correto afirmar que:
I. o estadista Mikhail Gorbachev, em 1985, assumiu o controle do Partido Comunista Soviético com ideias inovadoras. Entre suas maiores metas governamentais, Gorbachev empreendeu duas medidas: a perestroika e a glasnost.
II. a perestroika visava modernizar a economia russa com a adoção de medidas que diminuía a participação do Estado na economia. A glasnost (transparência) estabelecia algumas liberdades políticas e direitos individuais.
III. a implantação dessas medidas trouxe uma série de consequências, como, por exemplo, a declaração da independência de países que compunham a antiga URSS, tais como a Letônia, a Estônia e a Lituânia.
Das proposições acima,
a) apenas I está correta.
b) apenas II está correta.
c) apenas I e II estão corretas.
d) apenas II e III estão corretas.
e) I, II e III estão corretas.
Resposta: E
Gorbatchev foi responsável por adotar a perestroika e a glasnost como políticas de reformas para os aspectos econômicos e cívicos da União Soviética. Entretanto, essas medidas acabaram por gerar crises irreversíveis no Estado, levando à sua dissolução em 1991.
2. (Cefet-MG)
A União Soviética afunda-se, cartoon de Habib Haddad (França, 1991). Disponível em: http://disciplina-de-historia.blogspot.com.br/2012/05/o-fim-dauniao-sovietica-em-1991.html. Acesso em: 14 set. 2015.
A charge refere-se a um período da história soviética em que as
a) crises sociais e diplomáticas, protagonizadas por Kruschev, intensificaram a disputa nuclear.
b) revoluções populares e democráticas, lideradas por Lênin, instituíram o descontrole político.
c) reformas políticas e econômicas, efetivadas por Gorbachev, favoreceram a desagregação do país.
d) propostas financeiras e partidárias, apresentadas por Stálin, desestabilizaram os rumos da nação.
Resposta: C
Apesar dos pretextos de devolver à União Soviética o status de potência infalível, Gorbatchev acabou por “afundar” definitivamente o Estado socialista no ano de 1991.
Créditos das imagens
Fontes
ARBEX JÚNIOR, José. Guerra Fria: Terror de Estado, política e cultura. São Paulo: Editora Moderna, 1997.
GONCHARENKO, Roman. Há 25 anos começava o silencioso colapso da União Soviética, 2016. Deutsche Welle, 2016. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/há-25-anos-começava-o-silencioso-colapso-da-união-soviética/a-15319077
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: O breve século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências: Transformação econômica e conflito militar de 1500 a 2000. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1989.
MUNHOZ, Sidnei J. Guerra Fria: História e historiografia. Curitiba: Appris Editora, 2020.
WESTAD, Odd. A. The Global Cold War: Third World Interventions and the Making of Our Times. Cambridge: Cambridge University Press, 2007.